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Mãe de santo diz estar 'abalada e consternada' após juiz acusá-la de intolerância em caso com motorista por aplicativo

21/10/2025 17:38 G1 — Brasil

Mãe de santo denunciou ter sofrido intolerância por motorista de carro por aplicativo, em João Pessoa, e teve caso analisado por juiz, que é acusado de intolerância em sua sentença
Reprodução/Arquivo pessoal
A mãe de santo Lúcia de Fátima Batista de Oliveira, que acusa o juiz Adhemar Ferreira Neto de racismo religioso em um texto de uma sentença, disse estar "abalada e consternada" após a decisão. No caso, o magistrado negou uma indenização à mãe de santo que teve uma corrida cancelada por um motorista de aplicativo para ir a um terreiro de candomblé. O juiz entendeu que quem estaria cometendo intolerância foi a mãe de santo, não o motorista.
O Ministério Público da Paraíba (MPPB) abriu um procedimento para apurar o caso após a denúncia de uma associação de proteção ao direito religioso. O órgão enviou o caso à corregedoria do Conselho Nacional de Justilça (CNJ). O advogado da mãe de santo confirmou que recorreu da decisão do magistrado para instâncias superiores.
Em nota enviada ao g1, Lúcia de Fátima disse que "recebeu a decisão com profunda comoção e indignação", o que causou um "impacto emocional profundo".
"O teor, que não reconheceu o racismo religioso sofrido e, inversamente, sugeriu a minha intolerância, causou um impacto emocional profundo, afetando a mim, o meu terreiro, o Ilê Axé Opó Omidewá, e reverberando na dor e na luta de todos os Povos de Terreiro do nosso país", diz trecho da nota.
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Na sentença que o MP e a associação questionam, de setembro deste ano, o juiz analisa o caso em que a sacerdotisa solicitou uma corrida no aplicativo Uber para ir de um terreiro de candomblé até uma consulta médica. O motorista, respondeu por mensagem no aplicativo, no dia 23 de março de 2024: “Sangue de Cristo tem poder, quem vai é outro kkkkk tô fora”. A corrida foi cancelada em seguida.
A mãe de santo disse ainda que apesar de estar abalada emocionalmente, destacou que no âmbito de sua fé, ela continua "firme" para professar a liberdade religiosa.
"Apesar da perplexidade, da dor e do abalo emocional, a minha fé me mantém firme. Permaneço inabalável e confiante em Xangô, Orixá da Justiça, para que o erro seja corrigido, a verdade prevaleça e a verdadeira justiça seja estabelecida nas instâncias superiores", disse.
A resposta do juiz
Ao g1, o juiz Adhemar Ferreira Neto, do 2º Juizado Especial Cível de João Pessoa disse que a ação em que deu a decisão não corre em segredo de Justiça e que "qualquer do povo pode ter acesso a ela, pelas vias adequadas". Sobre a sentença, o juiz disse que a "conduta nos processos onde atua é pautada pela estrita observância às leis vigentes no país, à lei orgânica da magistratura nacional e ao código de ética da magistratura nacional".
Sobre a apuração em torno da sentença, o magistrado disse que "não tem como opinar sobre processo, meu ou de outrem, ainda não transitado em julgado. Pelo mesmo motivo, não tem como opinar sobre atividade externa relativa a esse processo, desenvolvida por quem quer que seja". (Veja a nota completa abaixo).
O g1 entrou em contato com a Associação de Magistrados da Paraíba, mas a entidade disse desconhecer a situação.
Entenda o caso
A mãe de santo fez um boletim de ocorrência sobre o ocorrido relacionado ao motorista de aplicativo, alegando intolerância religiosa, e também moveu uma ação na Justiça pedindo indenização de R$ 50 mil. O Ministério Público também entrou com uma ação para indenização de danos morais da empresa sobre o caso.
Na sentença do julgamento sobre a ação movida pela mulher, o juiz indeferiu o pedido da mãe de santo e, ainda inverteu a culpa da questão, atribuindo à própria Lúcia de Fátima a intolerância no caso, por achar que o dito pelo motorista era algo preconceituoso e não o ato de professar a própria fé dele.
"A autora, a se ver da inicial, ao afirmar considerar ofensiva a ela a frase 'Sangue de Cristo tem poder', denota com tal afirmação que a intolerância religiosa vem dela própria. E, não, do motorista inicialmente selecionado pela ré para transportá-la", diz trecho da sentença.
O g1 teve acesso ao documento em que a promotoria abriu a apuração e em que ela leva em consideração o entendimento do Instituto de Desenvolvimento Social e Cultural Omidewa, a associação que questtionou a sentença inicialmente. De acordo com o instituto, a sentença não é somente um erro jurídico, mas também uma manifestação de intolerância religiosa institucionalizada e um falho cumprimento do dever estatal de proteger a liberdade de culto.
No despacho da promotora Fabiana Lobo , ela indica três ações:
O envio do processo à corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para análise e possíveis medidas sobre a conduta do juiz e o desrespeito ao Protocolo de Julgamento com Perspectiva Racial;
Ofício à Delegacia de Repressão aos Crimes Homofóbicos, Étnico-Raciais e Delitos de Intolerância Religiosa (DECHRADI), para levantamento de inquéritos sobre racismo religioso na P

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